A paixão segundo G. H. – Clarice Lispector
CAFÉ LITERÁRIO DIGITAL – PEN CLUBE DO BRASIL Dia 19 de outubro de 2020 A paixão segundo G. H. – Clarice Lispector O debate sobre o romance A paixão segundo G. H. (1964), de Clarice Lispector, realizado no Café Literário Digital do Pen Clube do Brasil, foi realizado no dia 19 de outubro de 2020. Neste ano se comemora o centenário de nascimento da autora, que nasceu em Chechelnyk, em 10 de dezembro de 1920, e fica este vídeo como homenagem à data, já que tantas atividades foram desmarcadas, devido à pandemia. Ela faleceu no Rio de Janeiro em 9 de dezembro de 1977. Por meio das traduções e estudos de Hélène Cixous e Giovanni Pontiero, Gregory e Curt Meyer-Classon, Clarice Lispector alcançou fama internacional, bem demonstrada no livro de Diane Marting, Contributing ed., Clarice Lispector: a bio-bibliography, New York, Wesport, Greenwood, c1993, que mostra seu alcance até nos países asiáticos, como o Japão. O que distingue seu estilo do de qualquer outro autor é a impregnação filosófica, existencial de seus textos, a procura do da-sein, do estar-aí, o alcançar o ser, de Heidegger. Principalmente A paixão segundo G.H. se mostra um texto limítrofe entre literatura e filosofia. Clarice Lispector faz parte da segunda geração modernista, em especial de João Guimarães Rosa, com quem dialoga na busca de sintagmas inovadores, com metáforas e oxímoros inusitados, e no uso do sinal de infinito, ao final do texto, o mesmo que o mineiro utiliza ao final de Grande sertão: veredas (1956) Mas também mostra intertextualidade com obras modernistas da primeira geração. Além da evidente troca com a Metamorfose, de Franz Kafka, A paixão se inscreve num enredo subjetivo, num único dia da vida de uma mulher, inicialmente praticado por Joyce, retratando um dia da vida do sr. Bloom, em Ulisses (1920), experiência transposta por Virginia Woolf em Sra. Dalloway (1925). Todas essas obras modernistas se propõem a romper com o tempo linear, sob a influência da teoria da relatividade de Einstein e do fluxo da consciência de Dujardin, explorada por Joyce, além de enfatizar o tempo lógico (Lacan) ou seja, o tempo interior, independente do tempo cronológico externo. A epifania, técnica presente em Joyce e em Woolf, mas que Lispector travou consciência ainda jovem, em Katherine Mansfield, transforma um instante em toda uma extensão de tempo, pois tudo é visto do ponto de vista relativo da personagem – e do leitor, consequentemente. Lispector também foi, em A paixão, já em 1964, pioneira nos estudos feministas, mostrando uma personagem que se separa, que vive autônoma, que tem um aborto, e que assume uma vida independente, tudo isso no reduto da própria casa. A capacidade de empregar o lar como forma de inserção da literatura de autoria feminina no cânone literário masculino foi fundamental para a afirmação da escritora mulher na literatura. Foi através do aprofundamento das dimensões do eu, embora enclausurado nas paredes da casa, que a escritora se apresenta no panorama literário, nessa primeira fase do movimento feminista do século XX. Mesmo retratando uma artista plástica da alta classe média, o livro não está isento de um mergulho na diferença entre as classes sociais, quando contrasta a luz e o luxo da parte social do apartamento com a caverna escura, com uma pintura a carvão na parede, feita pela empregada Janair, e a presença da barata, no seu armário, símbolos de um passado renegado, reprimido, ancestral. Ao longe, a personagem ainda avista a favela do Leme. Esperamos homenagear, com esse vídeo do Café Literário Digital do Pen Clube do Brasil, nossa autora maior da literatura universal. Obrigada, Clarice! Luiza Lobo - Coordenadora