O Papai é Pop Podcast

Marcos Piangers
O Papai é Pop Podcast

Jornalista, escritor e pai deslumbrado

  1. Não é uma tragédia

    01/03/2018

    Não é uma tragédia

    Não é uma tragédia Minha irmã, filha de outro relacionamento da minha mãe, tem 30 anos e descobriu um tumor agressivo na mama esquerda no final do ano passado. Passamos os últimos meses cuidando disso. Minha irmã é jovem, o tumor é forte, sentimos todos o medo que se sente quando essa doença maldita chega perto de nós. Mas ninguém sofreu mais com a descoberta do que a minha mãe. Sei o que ela sente. Ela sente a revolta que um pai sente que pode perder um filho. Minha mãe entrou em conflito profundo com a injustiça do mundo, com uma doença que pode arrancar-lhe parte do seu próprio corpo emocional, rasgar seu peito e deixá-la sangrando pro resto da vida. Sei o que ela sente porque tenho filhas. Daria minha vida por elas. Minha mãe deseja fazer o mesmo. Geralmente, quando dizemos que daríamos a vida por um filho imaginamos o momento em que nos jogamos na frente de uma bala que está indo em direção dele. Ou um barco que afunda, ou uma corda que está prestes a se romper. São momentos em que podemos salvar a vida de um filho, mesmo que isso signifique morrer. Acho que todos nós faríamos isso. Mas no filme da vida real nunca podemos fazer isso por eles. O roteiro é injusto e cruel, temos que ver nossos amados em perigo, impotentes. Quando descobrimos o tumor escrevi o texto abaixo. Tive medo de publicá-lo e parecer insensível com o sofrimento de outras pessoas. Mas entendo também que todos os dias cometemos pequenas tragédias, quando não valorizamos o que temos plenamente. Essas coisas acontecem. Um jovem adoece no verão. Um senhor é atropelado por um taxi. A biópsia aponta que o tumor é maligno. Essas coisas acontecem todo dia. E todos os dias saímos de casa achando que jamais acontecerá conosco. Uma doença leva embora um pai. O médico comunica um exame preocupante. Uma moto atravessa um sinal fechado. Todos os dias isso acontece. E todos os dias nossos planos são os mesmos. Trabalho, almoço, trabalho, jantar. Não acho que seja uma tragédia quando essas coisas acontecem com a gente. Dizemos: “Que tragédia! Morreu tão cedo!". Não acho que seja uma tragédia. Acho que a vida é um amontoado de caos e coincidência. Acho que hoje estamos aqui e amanhã não estamos mais. Uma tragédia é não agradecer por esse tempinho que estamos aqui. Uma tragédia é não valorizar a vida em família. Uma tragédia é trocar o sorriso do nosso filho pelo celular. Um passeio em família pelas preocupações do trabalho. Uma tragédia é não abraçar as pessoas hoje. Uma tragédia é passar a vida em branco. Uma tragédia é achar que um dia vamos ser felizes, não hoje. Uma tragédia é achar que não vai acontecer com a gente. E a vida vai ficando pra depois. Um dia eu mudo de emprego. Um dia eu digo que gosto dela. Um dia eu faço uma viagem. Um dia eu vou ser voluntário nesse projeto. Não acho que seja uma tragédia uma jovem cheia de planos descobrir uma doença grave. Acho uma tragédia quando aprendemos a valorizar o que temos só depois de perder. Acho uma tragédia não termos ido ainda para aquela viagem dos nossos sonhos. Acho uma tragédia viver de aparências. Acho uma tragédia ter comprado coisas achando que isso seria felicidade. Acho uma tragédia trabalhar em algo que você odeia. Acho uma tragédia você passar a vida brigado com alguém. A morte não é uma tragédia. Tragédia é quando a gente não viveu.

    2min
  2. Eu quero que você finja | O Papai é Pop 2

    16/02/2017

    Eu quero que você finja | O Papai é Pop 2

    Me encontre por aí: Meu site - http://www.piangers.com Facebook - https://www.facebook.com/marcospiangers/ Instagram - https://www.instagram.com/piangers/ Podcast - https://soundcloud.com/piangers Youtube - https://www.youtube.com/piangers Receba minha newsletter - http://www.piangers.com/gruposecreto/ Camisetas do Papai Pop - http://www.papaipop.org Cada peça vendida reverte cinco pratos de comida para crianças com fome Conheça os livros - http://www.piangers.com/papaipop/ Conheça as palestras - http://www.piangers.com/palestras/ —————————————————————————————————————————————— Quero que você finja Quero que sorria se alguém disser que está crescida. Se alguém elogiar seu vestido, diga "muito obrigado". Diga que o elogio é muito importante pra você. Mesmo que você considere o elogio bobo, que suponha que a pessoa não tem capacidade para avaliar se o vestido é mesmo bonito. Quero que você finja. Quero que sorria e diga "muito obrigado". Quero que faça parecer sincero. Quando você souber mais que o professor, quero que não demonstre isso de forma grosseira. Quero que guarde suas espertezas para si. Ajude os colegas com dificuldades, tente explicar de uma forma paciente. Não tenha prazer em constranger outras pessoas. Já fiz isso e não me orgulho. Não é uma boa sensação, no longo prazo. Sei que, por alguns anos, você vai achar o mundo um lugar estúpido. As conversas de elevador são estúpidas, as perguntas nas provas são estúpidas, as ideias dos chefes são estúpidas. Você realmente sabe mais que todo mundo. Você tem soluções melhores, tomaria decisões melhores, conversaria sobre coisas mais importantes. Mas quero que você finja. Quero que você seja convincente em considerar outras pessoas valiosas. Quero que ouça suas conversas vazias com atenção. Quero que faça perguntas, que os faça sentir importantes. Quero que você finja ser doce, quando não tiver vontade. Que finja que tem prazer em segurar a porta para os outros, em ajudar nas compras, em ouvir histórias de pessoas idosas. Quando não sentir vontade, diga "fale-me mais sobre isso". Converse com as pessoas sem olhar para o celular. Quero que você finja que se importa. Que finja que se preocupa. Que seja cortês, mesmo quando ninguém devolver cortesias. Quero que você finja. Que se torne perita em simular doçuras. Que seja ótima em praticar bondades, em estabelecer empatias. Você já terá sido muito melhor que eu. E quando menos notar, será aquilo que fingia ser. Será doce, bondosa e atenciosa. Receberá carinho de todos. E encontrará pessoas mais jovens que você, mais cínicas e presunçosas. E espero que elas digam: "Muito obrigado, senhora. Seu elogio é muito importante pra mim". E espero que você acredite.

    3min
  3. O pai da Gabriela | O Papai é Pop 2

    15/02/2017

    O pai da Gabriela | O Papai é Pop 2

    Me encontre por aí: Meu site - http://www.piangers.com Facebook - https://www.facebook.com/marcospiangers/ Instagram - https://www.instagram.com/piangers/ Podcast - https://soundcloud.com/piangers Youtube - https://www.youtube.com/piangers Receba minha newsletter - http://www.piangers.com/gruposecreto/ Camisetas do Papai Pop - http://www.papaipop.org Cada peça vendida reverte cinco pratos de comida para crianças com fome Conheça os livros - http://www.piangers.com/papaipop/ Conheça as palestras - http://www.piangers.com/palestras/ O Pai da Gabriela Sempre que ia deixar minha filha na escolinha, vinha aquela menina de cabelo crespo. O nome dela era Gabriela. Enquanto dava tchau pra minha filha, a Gabriela sempre puxava papo, sobre os mais diversos assuntos. “Aquele é o seu carro?”, ela perguntava. “Sim”, eu respondia. “O do meu pai é melhor.” Aquilo me deixou meio constrangido. “O carro do meu pai é bem grandão. E superbonito”, disse a Gabriela. Com o tempo percebi que o objetivo da Gabriela era me desmoralizar. Só pode. Eu dando beijos de despedida na minha pequena e lá vinha ela. “Você é magro”, me disse uma vez. “Você acha? Até que estou me achando barrigudo”, eu disse. “Meu pai é forte. Ele consegue me levantar com um braço só”, ela falou. E assim era quase todo dia. “Meu pai tem um trabalho superbom.” “Meu pai comprou uma casa enorme.” “Meu pai se veste melhor que você.” Era como se a Gabriela fizesse bullying comigo. Comecei a evitar despedidas longas na frente do portão da escola, só pra não ser agredido pela Gabriela. Eu estava cansado de ser comparado com o pai da menina. Comecei a imaginar aquele cara, mais forte do que eu, mais bem-sucedido. Carro melhor, cabelo melhor, sorriso mais bonito. “Meu pai não tem essa barba feia”, ela disse pra mim uma vez, olhando meu cavanhaque. O pai da Gabriela era uma mistura de Rodrigo Hilbert com George Clooney. Passei a evitar a saída da escola. Me incomodava a possibilidade de encontrar o pai da Gabriela. Será que ele também iria me humilhar, como a filha tinha feito durante quase um semestre? Aquele homem carismático e charmoso iria apertar minha mão e dizer: “Você deve ser o barbudo raquítico de quem minha filha tanto fala!”. Até que um dia vi a Gabriela no colo de um homem. Os dois se abraçando, o olho da Gabriela brilhando enquanto olhava pra ele. Era um sujeito baixinho. Usava um terno maior do que devia, a bainha estava mal cortada. Era meio careca na região da testa, o nariz certamente não poderia ser chamado de pequeno. Estava feliz com a Gabriela no colo. Me cumprimentou rapidamente. Carregando mochila e brinquedos, dava beijos na barriga da filha, que gargalhava. Entraram os dois num Corsa sedan. E foram embora, sorrindo os dois. Gabriela e seu herói.

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