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Vamos comentar sobre os aspectos, muitas vezes polêmicos, do dia a dia da pesquisa que se faz pelo Brasil, nos Institutos de Pesquisa e nas Universidades.

Falando com Ciência Jose Carlos Pinto

    • Ciencia

Vamos comentar sobre os aspectos, muitas vezes polêmicos, do dia a dia da pesquisa que se faz pelo Brasil, nos Institutos de Pesquisa e nas Universidades.

    Várias universidades decidem não mais contribuir com empresas que organizam rankings acadêmicos

    Várias universidades decidem não mais contribuir com empresas que organizam rankings acadêmicos

    Você provavelmente recebeu mensagem há algumas semanas informando que a Universidade de Zurique decidiu se retirar e não mais contribuir com empresas que organizam rankings acadêmicos. Talvez você não tenha sido informado que outras universidades do mundo vêm também seguindo esse caminho, como Faculdades de Direito e Medicina nos Estados Unidos. As razões alegadas são muitas, como o uso de métricas obscuras e de pouco significado acadêmico. Contudo, todas parecem concordar com o fato de que os rankings deformam a atividade acadêmica, uma vez que as instituições passam a trabalhar para subir no ranking ao invés de servir aos interesses dos estudantes e comunidades em que estão inseridas.

    Os rankings acadêmicos existem desde sempre, mas nesse formato em que vemos hoje trata-se de um fenômeno relativamente recente, que vem se consolidando no século XXI. Acredita-se que os rankings foram criados e consolidados principalmente para atrair estudantes asiáticos, em especial os estudantes chineses, para as universidades ocidentais, a partir do momento que se observou uma queda contínua do número de estudantes de graduação e pós-graduação na Europa, Canadá e Estados Unidos. Nesse sentido, a participação de instituições brasileiras nesses rankings é ainda menos compreensível, pois o número de estudantes asiáticos nas instituições brasileiras é pífio. Rapidamente as empresas que organizam e divulgam esses rankings se tornaram empresas de consultoria que vendem estratégias para que instituições subam nos rankings que elas mesmas organizam. Além de absurdo, há aparentemente aqui um grave desvio ético. Esse movimento foi aos poucos sendo também transportado para o mundo dos pesquisadores, com preparação de rankings acadêmicos que comparam um médico tailandês com um historiador brasileiro, como se isso fosse possível.

    De minha parte, não contribuo com quaisquer desses rankings e ignoro as mensagens que solicitam que eu verifique meus dados em bancos de dados e responda questionários de reputação. No dia em que CAPES e CNPq organizarem uma base nacional da ciência brasileira, terão meu apoio. Aliás, meus dados estão disponíveis no Lattes. Quanto às empresas que organizam rankings de instituições acadêmicas e de pesquisadores, que sigam fazendo seu trabalho duvidoso, mas seu o meu input. Ressalte-se, e sem o input de número cada vez maior de instituições acadêmicas no mundo. Como essas, na minha opinião as instituições brasileiras deveriam simplesmente ignorar o trabalho dessas empresas de consultoria. E se acreditarem que esse trabalho é importante (eu não acho), que organizem um ranking que avalie a importância do trabalho para a sociedade brasileira.

    https://www.swissinfo.ch/eng/education/university-of-zurich-quits-international-university-ranking/73693006

    https://sciencebusiness.net/news/universities/utrecht-university-withdraws-global-ranking-debate-quantitative-metrics-grows

    https://www.universityworldnews.com/post.php?story=20240202121114196

    https://www.socialmobilityindex.org/withdrawal_rankings.html

    • 5 min
    Autores brasileiros não precisam pagar taxas de publicação ... Hmmmm ... Será ?

    Autores brasileiros não precisam pagar taxas de publicação ... Hmmmm ... Será ?

    Há pouco mais de um mês houve muita comemoração nas redes acadêmicas a respeito de um acordo assinado pela CAPES com editoras científicas segundo o qual os autores brasileiros deixam de pagar taxas de publicação em revistas abertas. Revistas abertas são aquelas em que o leitor não paga pela leitura ou download do trabalho. Como as taxas de publicação são muitas vezes altíssimas, o que poderia justificar essa tolerância e apoio das editoras à ciência nacional ?

    Na verdade, a história não é bem essa. O acordo apenas transfere o pagamento da taxa de publicação diretamente para a fonte: o orçamento da CAPES (ou do Ministério da Educação e do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação). Dessa forma, o pesquisador deixa de pagar com recursos de seu projeto particular, mas o orçamento efetivo para financiar projetos de pesquisa cai por conta do compromisso assumido com as editoras científicas. Por uma questão de transparência, a CAPES deveria divulgar no final do ano o quanto pagou por cada publicação brasileira coberta por esse acordo.

    O mercado de publicações científicas é muito lucrativo e premia efetivamente quem nada faz pela ciência, justificando a explosão do número de editoras científicas espalhadas pelo mundo, incluindo o Brasil. Esse mercado vem inclusive promovendo ações que comprometem a integridade científica do processo de publicação, forçando a barra para que os trabalhos migrem paulatinamente do modelo de publicação por assinaturas para o modelo de publicação aberta. Isso explica por que com frequência autores recebem mensagens padrões dizendo que seus trabalhos não se ajustam ao escopo de uma revista e podem ser transferidos para outras, que coincidentemente seguem o modelo de publicação aberta e cobram taxas altíssimas de publicação.

    Pesquisadores e associações científicas deveriam se organizar para combater e mudar esse modelo de divulgação científica. No século XXI é inadmissível que a comunidade aceite ser refém de um modelo explorador, que nada contribui com a geração de conhecimento e se apodera de fatia significativa dos orçamentos disponíveis para o setor. Parece óbvio que esse modelo de divulgação pode e deve mudar.

    https://www.gov.br/capes/pt-br/assuntos/noticias/capes-anuncia-parceria-para-acesso-aberto

    • 5 min
    Você quer fazer ciência ou percorrer um "drive-through" científico ?

    Você quer fazer ciência ou percorrer um "drive-through" científico ?

    Uma das piores consequências do produtivismo é a transformação do processo de geração de conhecimento em uma jornada através de uma espécie de "drive-through" científico. Nesse contexto, ao invés de ser apresentado a um problema relevante que aguarda uma solução, o pesquisador é levado a percorrer uma trajetória de atividades desenhadas essencialmente para maximizar a redação de artigos científicos e minimizar o tempo de expedição de diplomas.

    No curto prazo, essa estratégia parece ser apropriada. Afinal, o pesquisador é apresentado a um conjunto de tarefas bem definidas e previsíveis, garante a obtenção de um diploma em tempo curto e produz artigos científicos que serão bem avaliados pelos pares, pela CAPES, pelo CNPq e por eventuais bancas de concurso. Parece perfeito, não ? Só que não ...

    No longo prazo, essa estratégia pode ser muito ruim e causar muitos problemas relevantes para o ambiente científico. Por exemplo:

    1- Leva à deformação do pesquisador, que muitas vezes não compreende que a principal função da ciência é resolver problemas que ainda não encontraram respostas, e não produzir artigos científicos ou produzir diplomas em tempos curtos;

    2- Simplifica a atividade científica, que se concentra na solução dos problemas fáceis e previsíveis, ao invés dos problemas difíceis e desafiadores que a sociedade enfrenta;

    3- Afasta o pesquisador da realidade e da sociedade em que vive, já que os problemas reais são usualmente mais complexos, envolventes e multifacetados, o que pode aprisionar o pesquisador em torres de marfim;

    4- Gera aversão ao risco e induz o sistema de financiamento a apoiar apenas projetos de curto prazo e de baixa relevância;

    5- Induz o sistema de avaliação a se concentrar sempre no número de itens produzidos, ao invés da relevância dos problemas abordados e soluções encontradas.

    Não se engane: esse processo de deformação e simplificação do trabalho científico está em curso no Brasil. Até por isso, o produtivismo precisa ser enfrentado. Para o jovem pesquisador, fica o convite para a seguinte reflexão: você quer fazer ciência ou caminhar através de um "drive-through" científico?

    https://youtu.be/watch?v=ufCuko-H5ec

    https://youtu.be/watch?v=6Cj_7Xj5Lhg

    https://youtu.be/watch?v=y58ioc4OnMU

    • 5 min
    CNPq enfraquece programa de bolsas de demanda social e reforça elitização da pós-graduação no país

    CNPq enfraquece programa de bolsas de demanda social e reforça elitização da pós-graduação no país

    Circulou essa semana o resultado do Edital 35/2023, que distribui bolsas de pós-graduação para instituições no país. Várias instituições estão celebrando em suas páginas institucionais a captação de bolsas, mas não há qualquer coisa aqui para ser comemorada, pois o resultado ilustra de forma cristalina o esvaziamento do CNPq como instância de fomento à formação de pesquisadores no Brasil e a elitização da pós-graduação brasileira.

    Em primeiro lugar, o número de bolsas disponibilizadas é ínfimo e representa fração desprezível do total de programas de pós-graduação (menos do que uma bolsa por programa da UFRJ, por exemplo, indicando que vários programas não receberão bolsas) e principalmente do total de pós-graduandos matriculados em instituições do país (menos de 1% dos estudantes de pós-graduação da UFRJ, por exemplo). Em segundo lugar, o resultado reforça a política de concentração de bolsas em projetos, o que inibe a amplitude temática dos estudos conduzidos na pós-graduação, reforça o caciquismo (alguns professores controlam as bolsas) e inibe a formação de jovens pesquisadores lotados nos programas de pós-graduação do país.

    A elitização da pós-graduação brasileira precisa ser denunciada e combatida. O esvaziamento do papel do CNPq e a eliminação dos programas de demanda social não interessam ao país.

    http://resultado.cnpq.br/7769241787369798

    https://www.gov.br/cnpq/pt-br/assuntos/noticias/cnpq-em-acao/cnpq-divulga-resultado-preliminar-da-chamada-no-35-2023-pibpg-ciclo-2024

    https://posgraduacao.ufrj.br/pdfs/pos_em_numeros

    https://www.gov.br/participamaisbrasil/pnpg-2024-2028

    • 6 min
    É justo vincular o direito à defesa de tese e a expedição de diplomas a publicações em revistas? II

    É justo vincular o direito à defesa de tese e a expedição de diplomas a publicações em revistas? II

    Voltamos a esse tema por conta de uma discussão nas redes internas da UFRJ sobre o assunto. Por isso, complemento essa discussão com argumentos usados por colegas que são favoráveis à existência de vínculos entre a aceitação de artigos em revistas científicas e o direito à defesa da tese ou expedição do diploma. O vídeo inicial pode ser encontrado em:

    https://youtu.be/QO-uWMsyKcs

    Os argumentos mais comumente usados são apresentados a seguir.

    i) Sempre foi assim - não é verdade, sendo que a prática se consolidou no Brasil nesse século XXI. Além disso, o argumento é fraco, porque pode ser usado para justificar que nada mude sempre;

    ii) É assim em todo o mundo - não é verdade e vários países do mundo vêm se organizando para banir ou reduzir o impacto das práticas produtivistas da vida acadêmica;

    iii) É para o bem do aluno - é dúbio, pois a prática foi estabelecida para benefício dos programas e do processo de avaliação. Ressalta-se que poucos programas oferecem cursos de metodologia científica e redação científica para a formação dos estudantes;

    iv) É importante para o aluno - é dúbio, pois a prática exerce pouca ou nenhuma influência sobre a vida de quem se dirige ao mercado de trabalho. Além disso, é uma profecia que se auto-realiza, pois as regras produtivistas são estabelecidas e tornam importantes os respectivos índices produtivistas que são estabelecidos;

    v) Não podemos mudar sozinhos - é dúbio, pois as mudanças são sempre lideradas por alguém em algum lugar. Essas mesmas regras foram estabelecidas a partir da lógica produtivista liderada por instituições acadêmicas do sudeste do país através da CAPES;

    vi) Revistas dão chancela de qualidade - argumento falso, tendo em vista que a maior parte dos artigos jamais será citada e que os processos de revisão são muitas vezes ruins.

    Enfim, nada tenho contra a redação e a publicação de artigos. Essa é inclusive uma atividade que me dá muita satisfação. No entanto, para mim é um enorme equívoco estabelecer um vínculo de obrigação entre a publicação e defesa ou expedição do diploma.

    • 8 min
    Projeto previdenciário de bolsistas (PL 675/2023) é inócuo. Queremos direitos trabalhistas plenos

    Projeto previdenciário de bolsistas (PL 675/2023) é inócuo. Queremos direitos trabalhistas plenos

    O projeto de lei PL-675/2023, de autoria da senadora Eliziane Gama, que trata do regime previdenciário de bolsistas de pós-graduação e se encontra atualmente em regime de consulta pública, tem gerado muita discussão, mas é inócuo. Cheque o link:

    https://www25.senado.leg.br/web/atividade/materias/-/materia/152339

    Na prática, a proposta apenas reduz a alíquota padrão de 20% para 5% sobre a remuneração declarada, considerando que a contribuição deve ocorrer na forma autônoma, facultativa e abrindo mão do direito de contar o tempo de contribuição para fins de aposentadoria por tempo de serviço. Cheque o artigo de número 21, no parágrafo 2 da Lei 8212/1991:

    https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8212cons.htm

    Na prática, essa proposta não mudará coisa alguma na vida do bolsista de pós-graduação, caso venha ser aprovada. O que queremos é o reconhecimento de que os bolsistas são trabalhadores de fato da pesquisa que se faz no Brasil, nos moldes da proposta prometida por Ricardo Galvão, presidente do CNPq:

    http://www.iea.usp.br/noticias/cnpq-estuda-transformar-bolsas-em-contratos-de-trabalho-temporarios

    Cheque também vídeos anteriores do canal sobre a importância dos bolsistas para o sistema de pesquisa científica do país:

    https://youtu.be/heLxdzHbLic

    https://youtu.be/Dqy8tLuocbs

    • 5 min

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