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Direito Subjetivo Vinícius Monte Custódio

    • Science

    O advogado de bandido

    O advogado de bandido

    Não são raras as vezes que tive a oportunidade de observar um fenômeno peculiar relacionado ao ofício do advogado criminalista. Esses operadores do Direito recebem no cotidiano, velada ou explicitamente, denominações pejorativas, como "advogado de porta de cadeia", "advogado de bandido" etc. Os leigos, grosso modo, possuem um estranho senso de justiça e um curioso ranço inquisitorial do processo penal, eu diria. Possivelmente, a maior parcela desses descrentes da seriedade da advocacia correspondem também ao grupo dos que acreditam que a solução para os problemas da violência no Brasil está diretamente vinculada ao acirramento e a redução da lei e da maioridade penais, respectivamente, e a que a função do Ministério Público é acusar de forma desenfreada. Primeiramente, é forçoso esclarecer que o "bandido" só é bandido de fato, após o trânsito em julgado de sentença penal condenatória, do contrário é apenas um acusado ou suposto autor de fato criminoso, devemos, portanto, sempre nos nortear pelo direito fundamental à presunção de inocência (art. 5º, LVII da Constituição de 1988 e art. 8º, II do Pacto de São José da Costa Rica). Em segundo lugar, o [bom] advogado não está ali para defender o bandido. O advogado presta serviço público e função social em seu ministério privado, como consta do estatuto da profissão (art. 2º, caput e § 1º). O causídico defenderá sempre a administração e o ideal de Justiça, pois é ele que, em um Estado Democrático de Direito, é o maior garantidor e reinvindicador do contraditório e da ampla defesa. É dizer, não há Justiça sem advogado, uma vez que é esse profissional que zelará dentro do processo penal pela efetividade das garantias fundamentais, afastando o sentimento de vingança e permitindo a consolidação das instituições punitivas através do devido processo legal. Quando o Supremo Tribunal Federal, em julgamento histórico, deu procedência, por maioria de votos, ao Habeas Corpus (HC) 84.078 para suspender os efeitos da decisão condenatória de 1ª instância, para que o réu pudesse recorrer às instâncias superiores em liberdade, o que estava em jogo era justamente a presunção de inocência, que deve existir em qualquer regime que se intitule democrático. E, é aí que a advocacia cumpre o seu papel social garantidor. Precisamos ter em mente que a atuação do advogado não constitui uma afronta à sociedade, nem a torna um local mais inseguro. Na verdade, no cumprimento do seu mister, ele unicamente busca dar eficácia a direitos já previstos nessa mesma sociedade. Assim, a nobilíssima função do ad vocatus (em latim, 'aquele que é chamado' para interceder por aqueles que não têm voz ou já não podem fazer sua voz ser ouvida), será determinante para que sejam respeitados os direitos humanos do acusado e que este seja respeitado, pela sua condição humana, e reconhecido como um sujeito de direitos, ainda que culpado após o trânsito em julgado da ação penal. Um forte abraço.

    A suspensão de normas estaduais e municipais, à luz do art. 52, X da CRFB/1988

    A suspensão de normas estaduais e municipais, à luz do art. 52, X da CRFB/1988

    O Senado brasileiro desempenha importante papel na desacentuação das disparidades regionais dentro da federação. Diferentemente da Câmara dos Deputados, que é uma Casa constituída proporcionalmente ao número de habitantes no país; o Senado é composto por três senadores de cada Estado e do Distrito Federal, com mandatos de oito anos, renovados alternadamente por um e dois terços, de quatro em quatro anos. Sua relevância, na teoria, justifica-se pela voz que ele empresta às áreas de menor expressão política no país que, dependendo unicamente do sistema de proporcionalidade, invariavelmente seriam relegadas a um segundo plano nas decisões nacionais. Cumpre precipuamente a missão de garantir a homogeneidade no desenvolvimento das cinco regiões brasileiras, malgrado a praxis reiteradamente distorça esses valores e induza-nos a conclusões antagônicas. O art. 52, X da CRFB/1988 define a competência do Senado para a suspender a lei declarada inconstitucional pelo STF, a saber: "Art. 52. Compete privativamente ao Senado Federal: [...] X - suspender a execução, no todo ou em parte, de lei declarada inconstitucional por decisão definitiva do Supremo Tribunal Federal;"A questão que emerge de tal preceito constitucional é: A quem caberia a suspensão da execução da lei estadual ou municipal declarada inconstitucional pelo STF? O fato é que não existem órgãos de função análoga a do Senado nos poderes legislativos em sedes estadual e municipal. É dizer, a bicameralidade toma lugar unicamente no âmbito federal, não havendo, pois, de se falar em violação ao pacto federativo (art. 1º, caput da CRFB/1988). Uma vez que não exista órgão legislativo designado para o exercício de tal atribuição, como já salientado, a interpretação da norma do art. 52, X da CRFB/1988 deve ser, destarte, extensiva. Um parênteses, entretanto, há de ser colocado: Quando se fala no ato discricionário do Senado Federal para a suspensão das leis declaradas inconstitucionais, o entendimento, já pacificado pelo STF, é de que ele só se aplica ao controle de constitucionalidade por via incidental. Tendo sido declarada a inconstitucionalidade por via principal (ou concentrada), a decisão tem eficácia erga omnes e vinculante, per si basta para pulverizar do mundo jurídico os efeitos da norma impugnada, descabendo, pois, suscitar a conveniência e a oportunidade do Senado. Por derradeiro, a corroborar o entendimento supra, o ilustre constitucionalista prof. Luís Roberto Barroso aduz que: "A despeito da dicção restritiva do art. 52, X, [...] a interpretação dada ao dispositivo tem sido extensiva, para incluir todos os atos normativos de quaisquer dos três níveis de poder, vale dizer, o Senado também suspende os atos estaduais e municipais."¹ ¹BARROSO, Luís Roberto. Controle de constitucionalidade no direito brasileiro. 2 ed. 4 tiragem. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 111.

    O racismo invertido e a inconstitucionalidade das cotas raciais

    O racismo invertido e a inconstitucionalidade das cotas raciais

    O Democratas (DEM), entrou com ação contra a reserva de vagas pelo sistema de cotas raciais na Universidade de Brasília (UnB). De acordo com a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 186, o partido defende que a reserva de vagas é um retorno ao nazismo. A liminar será julgada pelo STF. As cotas raciais foram instituídas pela UnB no dia 17 de julho de 2009, sendo válido para o 2º vestibular promovido pela instituição neste ano. A decisão determina a reserva de 20% das vagas nos vestibulares para candidatos negros. Leia mais em: http://www.jusbrasil.com.br/noticias/1574165/partido-ajuiza-acao-contra-o-sistema-de-cotas-raciais-instituido-por-universidades-publicas A Constituição da República Federativa do Brasil tem como um de seus objetivos fundamentais "promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação" (art. 3º, IV) e assim garantiu que "Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade" (art. 5º, cabeça). Todavia, como resultado de uma evolução jurídica essa garantia constitucional que se convencionou chamar de princípio da isonomia de tratamento foi entendida pela doutrina como insuficiente. Estabeleceu-se, assim, uma importante dicotomia: a isonomia formal e a isonomia material. Hoje, é ponto pacífico que o tratamento igualitário não é suficiente para atender aos anseios de um Estado Democrático de Direito (isonomia formal). Destarte, é preciso dar tratamento igual aos iguais e tratamento desigual aos desiguais, de sorte que todos alcancem um patamar equânime de oportunidades (isonomia material). Não obstante o evidente exagero cometido pelo Partido Democratas (DEM) na comparação da decisão de instituir cotas com um retorno ao nazismo, essa medida é de fato um enorme retrocesso. O princípio da isonomia de tratamento, consagrado pela Constituição Cidadã, com a devida vênia, não pode ser invocado para endossar práticas discriminatórias unicamente para estabelecer privilégios com base em argumentações frágeis. Decerto que algumas etnias, particularmente os negros, foram, de um modo geral, historicamente segregadas e marginalizadas pelas classes dominantes, fenômeno não exclusivo do Brasil. Contudo a quem caberá pagar esse débito? É justo que essa "dívida histórica", se é que se possa chamar assim, seja paga pelo povo de hoje? Creio que a questão racial deixou há muito tempo de ser um fator de desequilíbrio na realidade brasileira. Qual desvantagem efetivamente teria um candidato negro de disputar vagas em um vestibular? Ele é inferior a qualquer outro candidato por isso? Na sua prova, por acaso, vem discriminada a sua raça de modo que o examinador possa preteri-lo por um outro candidato branco? Poder-se-ia argumentar que a população negra é predominante nas classes menos favorecidas e que por esse motivo estaria estatisticamente mais propensa ao insucesso. Bem, então o que se nota é que o problema é de cunho social, não étnico. Assim, a questão seria tratada de forma mais honesta se as cotas fossem exclusivamente para os extratos carentes da sociedade brasileira. Dá para sustentar que os negros pobres estão em condições mais adversas que os brancos igualmente pobres? E o que diremos então dos negros ricos (sim, eles existem): Devem ser dadas condições especiais a eles, em detrimento de eventuais candidatos brancos desafortunados e em maior carestia? Sinceramente, para todas as perguntas entendo que não. Outrossim, é no mínimo curioso observar essa tendência de determinação racial num país como o nosso. Diferentemente dos Estados Unidos, berço das políticas afirmativas e onde a segregação racial era institucional há poucas décadas, o Brasil é uma nação de grande

    Marcha da Maconha: apologia ao crime ou liberdade de expressão?

    Marcha da Maconha: apologia ao crime ou liberdade de expressão?

    Brasília - A Procuradoria-Geral da República (PGR) ajuizou no Supremo Tribunal Federal (STF) duas ações com o objetivo de suspender decisões judiciais que proibiram atos públicos pró-legalização das drogas. As ações foram protocoladas ontem (21) pela até então procuradora-geral em exercício Deborah Duprat. Leia mais em: http://www.jusbrasil.com.br/noticias/1576326/pgr-vai-ao-supremo-contra-proibicao-de-eventos-pro-legalizacao-das-drogas Na última terça-feira, voltou à tona a polêmica sobre a Marcha da Maconha. Alegam seus defensores estarem protegidos pela garantia fundamental à liberdade de expressão; seus opositores, entretanto, aduzem ser nada menos que uma manifestação criminosa coletiva, mais especificamente a de apologia ao crime. A bem da verdade, sou um defensor confesso da liberdade de expressão, desde que devidamente identificada, sendo dever do Estado garantir o direito de resposta, proporcional ao agravo, bem como a reparação por eventuais danos que venham a ser comprovados. A meu ver, é inconcebível uma liberdade mitigada: Ou bem ela se manifesta em sua plenitude, ou ela é simplesmente inexistente. Dentro de uma concepção de Direito Penal minimal e garantista, penso que o tratamento dispensado às questões juridicamente relevantes a essa seara deveria ocorrer sempre de modo residual. Por conta da obsolescência do nosso inflado Código Penal, muitas condutas típicas perfeitamente solucionáveis noutros ramos jurídicos menos onerosos continuam objeto da preocupação deste (v.g., os crimes contra a honra). Nessa medida, o exercício do livre manifestar do pensamento deve ser respeitado, até mesmo fomentado, pois é com o confronto de idéias que a dinâmica social realiza seu papel transformador. Assim, negar que uma pessoa defenda suas convicções é um posicionamento que beira o absurdo, que vai na contramão da história. Ora, se o poder emana do povo nada mais justo que o povo seja livre para se associar com fins pacíficos com o intento de deliberar acerca da continuidade da ordem normativa vigente e isso nunca poderá ser confundido com apologia ao crime (outro exemplo de anacronismo penal). A Marcha da Maconha, portanto, presta-se a esse papel questionador que, concordemos ou não com as ideias por ela ventiladas, alimenta a dinâmica das relações humanas. Primeiro, abre-se o debate, depois mudam-se as leis; e, finalmente, o que antes era ilegal, torna-se legal. Um forte abraço.

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