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Vamos comentar sobre os aspectos, muitas vezes polêmicos, do dia a dia da pesquisa que se faz pelo Brasil, nos Institutos de Pesquisa e nas Universidades.

Falando com Ciência Jose Carlos Pinto

    • Science

Vamos comentar sobre os aspectos, muitas vezes polêmicos, do dia a dia da pesquisa que se faz pelo Brasil, nos Institutos de Pesquisa e nas Universidades.

    Autores brasileiros não precisam pagar taxas de publicação ... Hmmmm ... Será ?

    Autores brasileiros não precisam pagar taxas de publicação ... Hmmmm ... Será ?

    Há pouco mais de um mês houve muita comemoração nas redes acadêmicas a respeito de um acordo assinado pela CAPES com editoras científicas segundo o qual os autores brasileiros deixam de pagar taxas de publicação em revistas abertas. Revistas abertas são aquelas em que o leitor não paga pela leitura ou download do trabalho. Como as taxas de publicação são muitas vezes altíssimas, o que poderia justificar essa tolerância e apoio das editoras à ciência nacional ?

    Na verdade, a história não é bem essa. O acordo apenas transfere o pagamento da taxa de publicação diretamente para a fonte: o orçamento da CAPES (ou do Ministério da Educação e do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação). Dessa forma, o pesquisador deixa de pagar com recursos de seu projeto particular, mas o orçamento efetivo para financiar projetos de pesquisa cai por conta do compromisso assumido com as editoras científicas. Por uma questão de transparência, a CAPES deveria divulgar no final do ano o quanto pagou por cada publicação brasileira coberta por esse acordo.

    O mercado de publicações científicas é muito lucrativo e premia efetivamente quem nada faz pela ciência, justificando a explosão do número de editoras científicas espalhadas pelo mundo, incluindo o Brasil. Esse mercado vem inclusive promovendo ações que comprometem a integridade científica do processo de publicação, forçando a barra para que os trabalhos migrem paulatinamente do modelo de publicação por assinaturas para o modelo de publicação aberta. Isso explica por que com frequência autores recebem mensagens padrões dizendo que seus trabalhos não se ajustam ao escopo de uma revista e podem ser transferidos para outras, que coincidentemente seguem o modelo de publicação aberta e cobram taxas altíssimas de publicação.

    Pesquisadores e associações científicas deveriam se organizar para combater e mudar esse modelo de divulgação científica. No século XXI é inadmissível que a comunidade aceite ser refém de um modelo explorador, que nada contribui com a geração de conhecimento e se apodera de fatia significativa dos orçamentos disponíveis para o setor. Parece óbvio que esse modelo de divulgação pode e deve mudar.

    https://www.gov.br/capes/pt-br/assuntos/noticias/capes-anuncia-parceria-para-acesso-aberto

    • 5 min
    Você quer fazer ciência ou percorrer um "drive-through" científico ?

    Você quer fazer ciência ou percorrer um "drive-through" científico ?

    Uma das piores consequências do produtivismo é a transformação do processo de geração de conhecimento em uma jornada através de uma espécie de "drive-through" científico. Nesse contexto, ao invés de ser apresentado a um problema relevante que aguarda uma solução, o pesquisador é levado a percorrer uma trajetória de atividades desenhadas essencialmente para maximizar a redação de artigos científicos e minimizar o tempo de expedição de diplomas.

    No curto prazo, essa estratégia parece ser apropriada. Afinal, o pesquisador é apresentado a um conjunto de tarefas bem definidas e previsíveis, garante a obtenção de um diploma em tempo curto e produz artigos científicos que serão bem avaliados pelos pares, pela CAPES, pelo CNPq e por eventuais bancas de concurso. Parece perfeito, não ? Só que não ...

    No longo prazo, essa estratégia pode ser muito ruim e causar muitos problemas relevantes para o ambiente científico. Por exemplo:

    1- Leva à deformação do pesquisador, que muitas vezes não compreende que a principal função da ciência é resolver problemas que ainda não encontraram respostas, e não produzir artigos científicos ou produzir diplomas em tempos curtos;

    2- Simplifica a atividade científica, que se concentra na solução dos problemas fáceis e previsíveis, ao invés dos problemas difíceis e desafiadores que a sociedade enfrenta;

    3- Afasta o pesquisador da realidade e da sociedade em que vive, já que os problemas reais são usualmente mais complexos, envolventes e multifacetados, o que pode aprisionar o pesquisador em torres de marfim;

    4- Gera aversão ao risco e induz o sistema de financiamento a apoiar apenas projetos de curto prazo e de baixa relevância;

    5- Induz o sistema de avaliação a se concentrar sempre no número de itens produzidos, ao invés da relevância dos problemas abordados e soluções encontradas.

    Não se engane: esse processo de deformação e simplificação do trabalho científico está em curso no Brasil. Até por isso, o produtivismo precisa ser enfrentado. Para o jovem pesquisador, fica o convite para a seguinte reflexão: você quer fazer ciência ou caminhar através de um "drive-through" científico?

    https://youtu.be/watch?v=ufCuko-H5ec

    https://youtu.be/watch?v=6Cj_7Xj5Lhg

    https://youtu.be/watch?v=y58ioc4OnMU

    • 5 min
    CNPq enfraquece programa de bolsas de demanda social e reforça elitização da pós-graduação no país

    CNPq enfraquece programa de bolsas de demanda social e reforça elitização da pós-graduação no país

    Circulou essa semana o resultado do Edital 35/2023, que distribui bolsas de pós-graduação para instituições no país. Várias instituições estão celebrando em suas páginas institucionais a captação de bolsas, mas não há qualquer coisa aqui para ser comemorada, pois o resultado ilustra de forma cristalina o esvaziamento do CNPq como instância de fomento à formação de pesquisadores no Brasil e a elitização da pós-graduação brasileira.

    Em primeiro lugar, o número de bolsas disponibilizadas é ínfimo e representa fração desprezível do total de programas de pós-graduação (menos do que uma bolsa por programa da UFRJ, por exemplo, indicando que vários programas não receberão bolsas) e principalmente do total de pós-graduandos matriculados em instituições do país (menos de 1% dos estudantes de pós-graduação da UFRJ, por exemplo). Em segundo lugar, o resultado reforça a política de concentração de bolsas em projetos, o que inibe a amplitude temática dos estudos conduzidos na pós-graduação, reforça o caciquismo (alguns professores controlam as bolsas) e inibe a formação de jovens pesquisadores lotados nos programas de pós-graduação do país.

    A elitização da pós-graduação brasileira precisa ser denunciada e combatida. O esvaziamento do papel do CNPq e a eliminação dos programas de demanda social não interessam ao país.

    http://resultado.cnpq.br/7769241787369798

    https://www.gov.br/cnpq/pt-br/assuntos/noticias/cnpq-em-acao/cnpq-divulga-resultado-preliminar-da-chamada-no-35-2023-pibpg-ciclo-2024

    https://posgraduacao.ufrj.br/pdfs/pos_em_numeros

    https://www.gov.br/participamaisbrasil/pnpg-2024-2028

    • 6 min
    É justo vincular o direito à defesa de tese e a expedição de diplomas a publicações em revistas? II

    É justo vincular o direito à defesa de tese e a expedição de diplomas a publicações em revistas? II

    Voltamos a esse tema por conta de uma discussão nas redes internas da UFRJ sobre o assunto. Por isso, complemento essa discussão com argumentos usados por colegas que são favoráveis à existência de vínculos entre a aceitação de artigos em revistas científicas e o direito à defesa da tese ou expedição do diploma. O vídeo inicial pode ser encontrado em:

    https://youtu.be/QO-uWMsyKcs

    Os argumentos mais comumente usados são apresentados a seguir.

    i) Sempre foi assim - não é verdade, sendo que a prática se consolidou no Brasil nesse século XXI. Além disso, o argumento é fraco, porque pode ser usado para justificar que nada mude sempre;

    ii) É assim em todo o mundo - não é verdade e vários países do mundo vêm se organizando para banir ou reduzir o impacto das práticas produtivistas da vida acadêmica;

    iii) É para o bem do aluno - é dúbio, pois a prática foi estabelecida para benefício dos programas e do processo de avaliação. Ressalta-se que poucos programas oferecem cursos de metodologia científica e redação científica para a formação dos estudantes;

    iv) É importante para o aluno - é dúbio, pois a prática exerce pouca ou nenhuma influência sobre a vida de quem se dirige ao mercado de trabalho. Além disso, é uma profecia que se auto-realiza, pois as regras produtivistas são estabelecidas e tornam importantes os respectivos índices produtivistas que são estabelecidos;

    v) Não podemos mudar sozinhos - é dúbio, pois as mudanças são sempre lideradas por alguém em algum lugar. Essas mesmas regras foram estabelecidas a partir da lógica produtivista liderada por instituições acadêmicas do sudeste do país através da CAPES;

    vi) Revistas dão chancela de qualidade - argumento falso, tendo em vista que a maior parte dos artigos jamais será citada e que os processos de revisão são muitas vezes ruins.

    Enfim, nada tenho contra a redação e a publicação de artigos. Essa é inclusive uma atividade que me dá muita satisfação. No entanto, para mim é um enorme equívoco estabelecer um vínculo de obrigação entre a publicação e defesa ou expedição do diploma.

    • 8 min
    Projeto previdenciário de bolsistas (PL 675/2023) é inócuo. Queremos direitos trabalhistas plenos

    Projeto previdenciário de bolsistas (PL 675/2023) é inócuo. Queremos direitos trabalhistas plenos

    O projeto de lei PL-675/2023, de autoria da senadora Eliziane Gama, que trata do regime previdenciário de bolsistas de pós-graduação e se encontra atualmente em regime de consulta pública, tem gerado muita discussão, mas é inócuo. Cheque o link:

    https://www25.senado.leg.br/web/atividade/materias/-/materia/152339

    Na prática, a proposta apenas reduz a alíquota padrão de 20% para 5% sobre a remuneração declarada, considerando que a contribuição deve ocorrer na forma autônoma, facultativa e abrindo mão do direito de contar o tempo de contribuição para fins de aposentadoria por tempo de serviço. Cheque o artigo de número 21, no parágrafo 2 da Lei 8212/1991:

    https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8212cons.htm

    Na prática, essa proposta não mudará coisa alguma na vida do bolsista de pós-graduação, caso venha ser aprovada. O que queremos é o reconhecimento de que os bolsistas são trabalhadores de fato da pesquisa que se faz no Brasil, nos moldes da proposta prometida por Ricardo Galvão, presidente do CNPq:

    http://www.iea.usp.br/noticias/cnpq-estuda-transformar-bolsas-em-contratos-de-trabalho-temporarios

    Cheque também vídeos anteriores do canal sobre a importância dos bolsistas para o sistema de pesquisa científica do país:

    https://youtu.be/heLxdzHbLic

    https://youtu.be/Dqy8tLuocbs

    • 5 min
    CAPES acerta ao colocar Plano de PG em consulta pública, mas ... o documento é muito ruim

    CAPES acerta ao colocar Plano de PG em consulta pública, mas ... o documento é muito ruim

    A CAPES acertou duas vezes com a divulgação do novo Plano Nacional de Pós-Graduação (PNPG) para o período 2024-2028. Em primeiro lugar porque o PNPG havia sido abandonado pelo governo anterior, que não tinha mesmo qualquer plano consistente para a educação no Brasil. Em segundo lugar porque colocou o documento em consulta pública, estimulando a participação de toda a sociedade brasileira no planejamento da pós-graduação do país. No entanto, o documento é muito ruim, pelas razões discutidas nesse vídeo. Em particular, faltam metas concretas, prazos concretos e prioridades do plano. Nesse contexto, contribuo com três ações concretas:

    1- Dobrar a participação de negros na pós-graduação brasileira até 2028, quando o plano se encerra. (Observo que essa meta é bastante acanhada, tendo em vista o baixíssimo percentual de negros, em especial da mulher negra, em todos os níveis da pós-graduação brasileira.)

    2- Instituir programa até 2025 que obrigue docentes e discentes bolsistas, financiados com dinheiro público, a participarem de ações acadêmicas na graduação e escolas de ensino médio no Brasil. (A FAPERJ tem programa de estímulo que pode servir de exemplo.)

    3- Instituir programa de compartilhamento compulsório de equipamentos financiados com dinheiro público nas centrais analíticas institucionais até 2025, a serem geridas por instituições de pesquisa de todo o país. (É preciso usar melhor os recursos públicos que financiam equipamentos e garantir acesso a todos.)

    Vou inserir essas sugestões na consulta pública estimulada pela CAPES.

    Se você quiser ter acesso ao plano e à consulta pública, cheque os links:

    https://www.gov.br/capes/pt-br/assuntos/noticias/capes-abre-consulta-publica-para-plano-de-pos-graduacao

    https://www.gov.br/capes/pt-br/centrais-de-conteudo/documentos/19122023_pnpg_2024_2028.pdf

    • 15 min

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